Doação pode nem sair do papel por falta de legalidade, diz advogado

Foto: Habeas Podcast

Em uma publicação anterior postada nesse blog, já havíamos aventado a possibilidade de que a possível doação anunciada pelo Prefeito Chico Brasileiro na quinta-feira (9), seria ilegal, na mesma toada o advogado, Dr. André Freire, presidente da Comissão de Acompanhamento Legislativo da Ordem dos Advogados do Brasil – Foz do Iguaçu, fez uma analise técnica e minuciosa sobre o tema. Confira:

A possibilidade de um ente federado doar dinheiro a outro não é amparada pela legislação brasileira vigente. Embora o federalismo brasileiro promova a cooperação entre União, Estados, Municípios e Distrito Federal, cada um desses entes possui suas competências e limitações estritas, especialmente no que tange à gestão financeira e orçamentária.

De acordo com o princípio da legalidade, um dos pilares da administração pública, qualquer ato do governo requer base legal. No contexto das finanças públicas, essa regra é ainda mais rígida. A Constituição Federal, ao especificar em seus artigos 167 e 168 a maneira como os recursos públicos devem ser geridos e transferidos, não deixa margem para práticas como a doação de recursos financeiros entre entes federados. Estas restrições são reforçadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que veda transferências voluntárias não previstas em lei.

Além disso, cabe ressaltar que os municípios, apesar de possuírem autonomia para legislar sobre assuntos de interesse local, não têm competência para tratar de temas que envolvam a gestão de recursos que afetem outros entes federados. Essa limitação impede que os municípios criem normativas sobre doações financeiras para outros entes, uma vez que isso afetaria o equilíbrio fiscal previsto constitucionalmente e as normas de responsabilidade fiscal.

Portanto, em uma análise criteriosa, conclui-se que a legislação brasileira não prevê, nem mesmo em caráter excepcional, a possibilidade de doações em dinheiro entre entes federados. Este é um tema que transcende a competência municipal e necessita de uma discussão mais ampla, sempre guiada pelos princípios de legalidade, responsabilidade fiscal e equidade na gestão dos recursos públicos de todos os brasileiros.

É imperioso destacar que Administração Pública não se pauta através de boas intenções, e sim de princípios de LEGALIDADE e GESTÃO.

O projeto de lei enviado pelo prefeito carece de elementos cruciais para a sua adequada apreciação e eventual aprovação, principalmente ao não esclarecer os mecanismos de transferência de recursos, uma falha significativa que impõe riscos à eficácia e à conformidade legal da proposta.

Embora o Estado de Calamidade Pública permita certa flexibilização das normas administrativas e de gastos, conforme previsto pela Lei nº 12.340/2010 e outras normativas pertinentes, isso não equivale a uma dispensa total da observância às leis. As medidas adotadas devem sempre buscar o equilíbrio entre a rapidez necessária no atendimento das urgências e o respeito aos ditames legais e aos princípios da boa administração.

As flexibilizações permitidas devem ser interpretadas restritivamente e aplicadas de maneira que não comprometam a transparência, a accountability e a efetiva gestão dos recursos públicos. A falta de especificação no projeto, portanto, não apenas fragiliza a proposta como pode vir a comprometer sua execução sob os aspectos legal e administrativo A Administração Pública não vive de boas intenções, mas sim da estrita observância à legalidade e uma gestão eficiente e responsável. A situação de calamidade exige respostas rápidas, mas também meticulosamente alinhadas às exigências legais e administrativas vigentes.

Em um projeto brilhante, as sombras de intenções obscuras podem se esconder à vista de todos.

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