“Consórcio de suplentes” promete cargos para casar mandato na Câmara de Foz

Áudios revelam articulação criminosa entre ex-assessor e suplentes para garantir denúncia na Câmara Municipal.

Uma trama detalhada para cassar o mandato da vereadora Anice Gazzaoui (PP) em Foz do Iguaçu envolvia não apenas a formulação de uma denúncia contra ela, mas também a promessa de cargos públicos em um esquema de divisão de salários.

Os áudios, gravados por uma advogada abordada para integrar o esquema, revelam que a conspiração era liderada por Marcos Antônio da Silva, ex-assessor de Anice e réu na operação Cashback, e incluía Ian Vargas (PT), terceiro suplente da chapa petista, e Paulinho da Saúde (PP), primeiro suplente da parlamentar, que assumiria sua cadeira em caso de cassação.

A estratégia, conforme discutida nos diálogos, consistia em desgastar politicamente Anice com a abertura de um processo de cassação na Câmara Municipal. O objetivo não era apenas viabilizar a posse de Paulinho, mas também provocar o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) para agir contra a vereadora, a exemplo do que ocorreu em setembro de 2024. Na ocasião, acusações apresentadas pelo próprio Marcos Silva resultaram na operação Cashback, deflagrada em meio ao período eleitoral.

Os áudios mostram que Marcos Silva e Ian Vargas não apenas arquitetavam a cassação, mas também negociavam a nomeação de aliados em cargos na assessoria parlamentar de Paulinho, prometendo benefícios políticos e financeiros futuros aos envolvidos.

“A gente trabalha tudo junto aí, tudo que é processo, tudo que é coisa, e a gente está trabalhando essa função aqui”, afirma Ian Vargas ao apresentar Marcos à advogada chamada para ser laranja no esquema.

Nos diálogos, Marcos se identifica como um dos coordenadores da campanha de Paulinho da Saúde em 2024 e detalha como as nomeações seriam organizadas. Ele afirma que três cargos já estavam reservados – um para ele, outro para João Motoka e um terceiro para Reinaldo, ligado à Liga dos Árbitros. Segundo Marcos, uma quarta vaga havia sido deixada em aberto para um profissional da área jurídica, justamente para trabalhar junto ao processo de cassação de Anice.

“O Paulinho não se elegeu, ficou como primeiro suplente, e eu dei a sugestão: ‘Por que não trazer alguém da área jurídica?’. Hoje nós temos três assessorias. (…) Sobrou uma assessoria que seguramos justamente para colocar alguém da parte jurídica para trabalhar (a representação).”

A oferta era clara: a advogada deveria entrar com um pedido de cassação de Anice, alegando quebra de decoro. Em troca, seria nomeada para um cargo na assessoria parlamentar de Paulinho.

Os áudios revelam ainda a tentativa de Marcos Silva de convencer a advogada a integrar o esquema, minimizando os riscos e possíveis desdobramentos da manobra. Ironicamente, o articulador do esquema criminoso argumenta que a cassação de Anice poderia ser justificada sob o pretexto da defesa da “moralidade da Câmara”.

“Não tem o que dar ruim. Porque você é uma cidadã que está entrando com uma representação pedindo a moralidade da Câmara Municipal. É um direito seu.”

O ex-assessor também busca desassociar Ian da articulação política do esquema, alegando que ele não é suplente da mesma chapa de Anice e Paulinho, numa tentativa de afastar indícios de conluio entre o grupo.

“Ah, pode dar outra repercussão para você (advogada)? Não. O máximo que pode é te expor na mídia. Ah, estão querendo fazer politicagem e tal? Se ligam você ao Ian. Por que vão ligar ao Ian? Se o Ian sequer é suplente daquela chapa? Ian é da chapa do PT.”

A íntegra dos áudios foi encaminhada ao GAECO, que deverá investigar se os envolvidos cometeram crimes como corrupção, tráfico de influência e associação criminosa ao arquitetar a tentativa de cassação de Anice Gazzaoui.

Planejamento incluía manipulação da imprensa

Os áudios também revelam que Marcos pretendia manipular veículos de imprensa para gerar pressão pública sobre os vereadores no momento do protocolo da representação contra Anice.

“Precisa ser aquela coisa cronometrada. Protocolou, tem que ir para a mídia, colocar pressão nos vereadores”, afirma Ian.

Marcos, por sua vez, detalha como mobilizaria a cobertura jornalística. “Quando vocês protocolarem, vocês me avisam a data que eu já vou avisar o pessoal da Rádio Cultura. Que aí o pessoal da Rádio Cultura vai estar lá (na Câmara) e vai pegar na hora. Talvez a RPC, também”, explica.

O objetivo era garantir que a imprensa estivesse presente no ato do protocolo, amplificando o impacto da ação e criando um ambiente político desfavorável à vereadora.

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